entrego-me

Tu és o doce que derrete na minha boca. O sangue que corre nas minhas veias. O ar que entra nos meus pulmões. Na mesma rapidez que a chama queima a folha, tu consomes o meu ser, domina o meu eu. Submeto-me às tuas vontades, subordino-me aos teus desejos, sou o teu objeto, para ser usada e abusada sem questionar. Rendo-me às tuas exigências. Converto-me na tua escrava. O que é de tua vontade, o faço.

Pego-me viajando em teus olhos, embriagada pelo teu perfume, inebriada pelo som da tua voz. Tuas mãos me acalmam e teus beijos alucinam-me. A um simples toque teu, minha pele se arrepia, minha nuca se enrijece e meu coração acelera. Sinto como se minhas entranhas mudassem de lugar umas com as outras, como se o único som no mundo fosse a tua voz, o único sabor fosse o do teu beijo, a única cor a dos teus olhos, o único aroma o do teu perfume.

Entrego-me à ti, pronta para satisfazer tuas mais loucas ambições, como o servo para com o seu dono.

terreno de peleja

Encaro aqueles olhos negros como um tigre prestes a atacar sua caça, enquanto me movo sinuosamente com o ritmo da música que toca ao fundo. As batidas da música intercalam com as do meu coração, e mesmo sem notar qual o som que toca, danço como se fosse a minha última dança. Como se depois dessa, minha vida chegasse ao fim.

Percebo que seus olhos fixam nos meus; eu os fecho, e sorrio. Enquanto minhas mãos percorrem meu corpo, guio meu quadril ritmadamente de um lado para o outro, meus pés deslizam harmonicamente com as batidas e meus cabelos brincam nas minhas costas.

Surpreendo-me ao abrir os olhos. Minha presa está diante de mim, com um sorriso malicioso em seu rosto. Sem nem tempo de esboçar alguma reação, sou segurada pela cintura e os papéis são invertidos. A presa agora sou eu, sendo vagarosamente saboreada pela minha outrora caça. Sua boca avança contra a minha, e eu sinto o sabor amargo da cerveja misturado com gosto acre do cigarro. A língua quente explora minha boca e diverte-se com a minha. Tenho meus cabelos presos com sua mão direita enquanto a esquerda me leva em direção ao seu corpo.

Tudo acaba tão rápido como começou. Não tenho tempo nem de perguntar seu nome ou de me despedir. Vejo apenas sua silhueta desaparecendo na multidão. Fico imóvel, como a caça jaz após ser desbravada pelo seu caçador.

reflexão

senti a brisa suave roçar de leve meu rosto e fechei meus olhos, saboreando a intensidade que o momento me proporcionava. descanso as costas na árvore e largo o livro que já começava a aborrecer-me.
no céu, as cores escarlates anunciavam o fim de mais uma tarde longa. o cheiro de grama fresca atiça a minha memória, levando-me a lembraças remotas de minha infância, quando tudo era simples, claro e puro. o tempo passa, as coisas complicam e a vida se torna confusa.

o que quero ser? o que quero fazer? quero ser amada? quero amar? quero ser responsável? quero errar? quero aprender? quero chorar? quero vencer? quero voar?

levanto, acendo um cigarro e volto para casa. volto para a minha certeza de que não há certeza.

seguindo pela estrada

Com as mãos geladas segurando o volante ela dirigia rápido pela
estrada. Os cabelos esvoaçando freneticamente com o vento. A
boca seca e os olhos marejados. Milhares de imagens passavam
pela cabeça dela, inclusive a dela jogando o carro estrada a
fora, mas nenhuma delas nítida o suficiente para que focasse em
um apenas. Resolveu parar na primeira lanchonete de beira de
estrada que encontrou. Era suja, pequena e pobre. Ao menos
estava quente ali dentro. Sentada em uma das mesas tortas da
lanchonete pediu um café. Forte, foi o que ela disse. Enquanto
esperava, apoiou a cabeça em suas mãos e suspirou. Um suspiro
longo e calmo. Como se tentasse afastar dela toda a aflição que
a assolava.

Foi quando lembrou daqueles olhos, os olhos que ela tanto
gostava de apreciar, os mesmos olhos que a olhavam com ternura,
olharam com indiferença. Os mesmos olhos que ela admirava,
olharam secos e com repreensão. Lembrou também de sua boca.
Aquela mesma boca que ela tanto saboreou o gosto doce e
delicado, aquela mesma, disparou veneno em forma de palavras
contra ela. As mãos que ela tanto sentiu percorrerem o seu
corpo com afeto, sentiu também lançar um tapa em seu rosto.

Experimentou as lágrimas descendo pelo rosto e não fez questão
de reprimir. Deixou que pendessem pela face e a sensação foi
boa. Assim que sentiu a garçonete deixar seu café ali, levantou
a cabeça e de leve secou com um lenço. Pegou a xícara e sentiu o
calor envolver suas mãos, suspirou profundamente e levou o café
em direção à sua boca. O gosto amargo surpreendeu seu interior
e ela, involuntariamente apertou os olhos. Tomou outro gole,
dessa vez maior e mais rápido. Como o tiro de um canhão a
realidade atingiu-a. Tal a forma que ela até mesmo recuperou
sua cor habitual.

Mas nada do que fizesse, ouvisse, ou tentasse, afastariam dela
a idéia de que agora, lhe faltava um pedaço. Um pedaço
fundamental, vital. Sua essência havia sido roubada. Ela tentou
imaginar sua vida daqui para frente. Como seria viver sem o seu
talismã?

Tomou o resto do café em poucos goles. Deixou uma nota em cima
da mesa e levantou. Buscou suas chaves na bolsa e foi para o
carro. Sentada no banco pousou suas mãos ao volante e deu a
partida. Fechou os olhos, cerrou os dentes e acelerou. Acelerou
como nunca havia feito na vida. Sem abrir os olhos, continuou
seu caminho em direção ao seu triste destino. Sua jornada durou
pouco tempo, pois após sair da lanchonete, antes de 60 segundos
completarem, todos que estavam por perto puderam escutar o
barulho de algo pesado chocar-se em algo sólido. Um barulho
severo, rude. O barulho do fim.

o desejo

o calor dos teus braços me envolve
o desejo corre em minhas veias
a forma como tu me olhas
acende e provoca minha libido
a forma como tu me tocas
me mata de tanto prazer
esse teu carinho em demasia
superando todos os que eu já tive
implorando para que eu te ame
suplicando para que eu me entregue

o gosto do teu beijo tem sabor de amor
me envolve e me faz te querer por muito
mas isso não importa
o que eu quero é aproveitar cada minuto contigo
não importa quantos sejam
mas que cada um seja melhor que o anterior

eu serei tua

sussurre em meu ouvido
eu gosto
toque minha nuca
eu me renderei
arranhe-me
eu me torno tua escrava
me abrace forte
eu posso morrer depois disso
me surpreenda
brinque comigo
me enlouqueça
me ame
me faça explodir
não me deixe ver
eu quero te sentir
me faça especial
e eu serei eternamente tua

agonia



agora eu começaria
eu falaria
de palavras eu encheria
toda essa porcaria
e eu não pararia
eu não cansaria
você até choraria
pediria
será que eu o faria?
mas eu não cansaria,
eu até me animaria
e claro, continuaria
mas você voltaria
imploraria
sera que eu me calaria?
suficiente não seria
somente o que você pedia
mas você não aguentaria
por perdão aclamaria
mas fazê-lo teria
com suas mãos me enforcaria
até ter certeza de que me mataria
e então de minha boca nenhum som sairia.

um soneto sem nome


sigo o meu desejo? sigo o caminho da razão?
maldita vida que insiste em me testar
procuro as respostas, onde elas estão?
e não as acho em nenhum lugar


cruel destino que te pôs na minha frente
fez que minha cabeça só em ti pensasse
pensei: grite, mostre a todos o que sente
mas não queria que nenhum rosto chorasse


quando te beijei, meu coração sorriu
o gosto doce dos teus lábios me marcou
eu fiquei feliz, mas ninguém viu


lembro do teu cheiro e te procuro em minha mente
te imagino junto comigo, sem culpa
e vivo assim, te querendo quieta somente